segunda-feira, 24 de março de 2008

Suspensos










Foi no tempo em que tudo era suspenso
samambaias, lustres, os móbiles no quarto
os avós no retrato, espiral no incenso...
no tempo em que se bordava
espelhinhos nos vestidos, bolsinhas atravessadas
correntinhas, anéis de prata, o tempo odara
que viajava no trem das cores
no som da flauta doce, bambu, Bambuí
pirâmides de cristal, pedras de rio, Saí...
num tempo que ficou por aí
pelos caracóis dos cabelos, pelas conchas
mar de ilha, nas flores, no tom maravilha
por baixo dos pelos das axilas
das meninas extrovertidas...
pelas penas de pavão de Krishna, num brinco
nas argolas, nas tranças de um cinto
solas de borracha, couro cru, no homem nu
que correu pela cidade descalço, sem sandálias
no tempo das dálias no teatro, cena muda
o grito nas praças, esquinas, nas ruas
as casas fechadas, as pedras, vidraças... fumaça.
Um tempo que ficou pelas cartas do Henfil
pelas mãos de todas as mães
de maio, de agosto, de abril...
o tempo da sanha, da cana, sacana, façanha
e alguns até hoje ninguém nunca viu.
Um tempo suspenso sem documento
sem lenço pras lágrimas das Eunices
Angélicas, Marias na certa mania
de ter fé na vida, na força, na raça
no fio das alegorias, nas penas das asas caídas
dos anjos suspensos bordados no tempo
em estado de graça...

imagem: "croquis dos anjos - Zuzu Angel" (extraída da internet)

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